Alice tem dois protagonistas: Nuno Lopes e Lisboa. Nuno Lopes tem inquestionavalmente das maiores interpretações de sempre do cinema português. Lisboa tem o retrato oculto mais correcto dos últimos anos. Ambos vivem em extrema solidão.
Marco Martins, nesta sua primeira longa-metragem, quase se arriscou a ficar sem filme. Afinal o realizador e argumentista, eliminou ao máximo todos os conceitos cénicos e dramatúrgicos, expondo-nos a um retrato nu e cru da solidão e da ausência. Alice baseou-se no desaparecimento do jovem português Rui Pedro e da eterna busca solitária e obsessiva da sua mãe, mas não deve ser reduzido a isso.
Interessante também são as temáticas abordadas por Marco Martins, que vão além do desaparecimento e busca de uma criança, explorando ao máximo a vertente humana das suas personagens. Alice explana o modo como várias personagens lidam com a solidão e a ausência, através de Mário. Todos eles vivem em solidão, servindo-se da agonia de um pai em busca de uma filha, para colmatar a ausência que eles mesmo sentem. A privacidade e o Big Brother, explorados por Orson Welles, são subtilmente abordadas no filme, sob a forma do sistema de vigilância com câmaras instaladas em pontos estratégicos de Lisboa, de forma a Mário conseguir vigiar as pessoas e notar qualquer pormenor que o conduza a Alice.
Alice pode-se tornar um filme monotonamente constante, assente em flashbacks pouco narrativas, quase sem diálogos ou monólogos. Afinal, Alice é um filme sobre a ausência e que melhor metáfora para isso que o silêncio? Marco Martins aproximou-se dos limites daquilo que podemos considerar um filme e conseguiu-o com uma mestria invejável. Mais um ponto a favor será sobretudo a banda sonora de Bernardo Sassetti, que ajuda a aumentar a beleza do argumento.
Etiquetas: Crítica Cinematográfica
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