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Gran Torino

Clint Eastwood é Mr. Kowalski. Clint Eastwood é aquele homem pertencente à velha guarda dos costumes. Do Cinema. Do verdadeiro Cinema que já pouco se faz por Hollywood. Inegavelmente, o realizador e actor é dos poucos capazes de criar um clássico moderno, como ninguém.



Gran Torino é desses clássicos modernos. Nunca fui grande seguidor do realizador, apesar de reconhecer o seu bom trabalho na área do Cinema. Mas este filme, é uma pequena obra-prima, que não se compreende como foi afastada dos Óscares deste ano.

A fórmula de Eastwood mantém-se a mesma. A austeridade, a simplicidade, as temáticas dramáticas, os dramas humanos, os contrastes sociais, a crítica às grandes instituições. E sempre a figura central, de contornos inconfundíveis, postura firme, visão semicerrada tal como a personagem Christine Collins, em Changeling. Gran Torino é mais que uma reflexão sobre a velhice. É o retrato de uma raiva incontida, de um senso de humor despretensioso, do significado da vida e da morte. O filme vive à base dos enquadramentos simples, da exibição perfeccionista dos pormenores onde nada surge por acaso.

Além do argumento e dos diálogos com a temática do revivalismo do passado da Guerra na Coreia, dos sentimentos racistas e xenófobos, Gran Torino vive com um soberbo trabalho fotográfico, com um excelente jogo de luz e sombra (evidenciado pelos posters do filme) corrosivo e marcante.



A história respira Clint Eastwood. Atrás e à frente da câmara, com a cartilha de normas rígidas a que já nos habituou. Sobretudo é uma história de uma amizade improvável entre duas personagens opostas e que, aparentemente, seriam inconciliáveis. Mesmo quando Mr. Kowalski rosna a quem odeia, mesmo quando abomina a decadência da juventude actual, nota-se que redescobre o significado da vida e da tolerância.

Pecado seria também não falar da banda sonora do filme, que apesar de ser reduzida ao máximo, como é habitual nos filmes do realizador, surge em momentos chave de Gran Torino, contribuindo para exponenciar a beleza da película. Destaque ainda para a sequência final, onde Clint Eastwood nos brinda como uma composição escrita e cantada por ele.

A interpretação de Clint Eastwood não vale um Óscar, mas é denotadora de como um actor deve trabalhar uma personagem. Mas o maior defeito de Gran Torino e que lhe impossibilita atingir um estatuto maior tem que ver com o erro de casting. O elenco secundário tem más interpretações ou abaixo do desejado. Bee Vang, enquanto Thao tem um péssimo desempenho: inconsistente, incoerente e inexpressivo. Já Ahney Her tem uma personagem interessante e mordaz, mas cuja interpretação poderia ser muito melhor.



Apesar desse pequeno erro, Gran Torino é um clássico contemporâneo, que merece acima de tudo um reconhecimento maior, que não chegou a obter.

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O Visitante

Solidão. Um homem que vive solitariamente e sem objectivo na vida, uma figura austera e sem sentido, que vive a vida num fingimento absoluto. É este o ponto de partida para O Visitante, um filme dito independente, com um baixo orçamento, mas que não foi por isso que a Academia se coibiu de o trazer à ribalta, ou pelo menos ao seu actor principal.



Richard Jenkins tem uma currículo extenso. Nos últimos 20 anos, participou em pelo menos 60 filmes, mas muitos deles em papéis secundários ou sem grande impacto no argumento dos mesmos. Da figura patriarcal de Six Feet Under, Richard Jenkins parte para a história de um homem que reaprende a viver. Richard Jenkins é duplamente um visitante. É quase um visitante na sua própria casa, mas também no sentido mais altruísta da palavra. O actor tem aqui uma bela interpretação, um papel que lhe coube que nem uma luva, uma prestação simples, mas poderosa.

Também Haaz Sleiman além de genuinidade estampada no rosto e em cada cena em que entra, dá ao espectador um desempenho caloroso e fresco, mesmo nas cenas mais dramáticos. Mas o destaque cai principalmente sobre Hiam Abbass, pois em todas as cenas que a actriz surge causa impacto. O seu olhar é poderoso, a postura com que interpreta as suas cenas e falas é extasiante.

Sem grandes pretensões, Tom McCarthy (The Station Agent) conduz o filme e todas as cenas competentemente, guiando o espectador através de um argumento simples, mas com um conceito importante. O Visitante transmite uma mensagem de tolerância e humildade, um conceito humanitário em vias de extinção nos nossos dias, despertando para a temática da imigração pós 11 de Setembro. Mais que ficção é uma crítica ao nosso complexo sistema burocrático e que tantas vidas deixa suspensas.



O Visitante é despretensioso, simplista e básico. Mas ao mesmo tempo apresenta um argumento consistente e coerente, a um ritmo agradável, à base de temáticas ricas, interessantes e introspectivas, num ensaio sobre o melting pot e o drama da imigração.

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Frost/Nixon

Não é o filme do ano e dificilmente o melhor dos candidatos ao Óscar deste ano, mas não podemos descurar Frost/Nixon como o grande filme-confronto da história do cinema. O que à partida poderia afastar muitas pessoas da salas de cinema, devido à temática política que francamente exibe, não deve ser reduzida a essa forma limitada. O filme de Ron Howard (A Beautiful Mind) é um excelente produto cinematográfico, dotada de boas interpretações e de uma montagem exímia.



O célebre caso de Watergate e do impeachment do Presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon fez correr muita tinta na época, mas a polémica ressurgiu anos mais tarde quando um artista do entretenimento televisivo David Frost (na altura quase desconhecido) liderou a mais importante e popular entrevista política da era moderna.

O argumento de Frost/Nixon basea-se numa peça de teatro da autoria de Peter Morgan e tal como foi notoriamente aclamado na altura em que estreou nas salas de teatro, o mesmo se passou perante a versão cinematográfica. Muito desse reconhecimento da crítica advém da realização limpa de Ron Howard, mas também do lado humano que consegue imprimir nas personagens, com especial destaque para algumas das cenas mais marcantes da entrevista.

O trabalho de montagem a cargo de Daniel P. Hanley e Mike Hill é certamente um dos melhores dos oscarizáveis deste ano. O excelente trabalho desta dupla é conhecido desde A Beautiful Mind, Cinderella Man e The Da Vinci Code. Em termos físicos e visuais todo o panorama global resulta e muito bem naquele que se tornou um dos mais interessantes e inquietantes thrillers políticos. Da mesma forma Susan Benjamin está de parabéns por todo o set, especialmente a nível da decoração do local onde as entrevistas foram feitas, estando altamente fiéis ao sítio original.



O filme de Ron Howard segue o conceito de abordar o escândalo, mas não de forma tablóide ou abusiva, à semelhança do que o argumentista Peter Morgan fez com The Queen. Não assistimos a um rol de visões manipuláveis, como poderíamos esperar, mas as cenas em que adopta a técnica da versão documental, é uma forma de fazer o espectador acreditar naquilo que vê.

O filme brilha tanbém pela excelente interpretação de Frank Langella no papel de Richard Nixon, incorporando os maneirismos e a pose dramática do ex-presidente dos Estados Unidos. A sua voz portentosa e a sua atitude austera transmitem uma grande carga dramática a todo o filme. A sua personagem é exímia no controlo político e na manipulação dos seus ideais.

Infelizmente, apesar da importância da personagem de David Frost, Michael Sheen ficou um pouco aquém do que se poderia esperar, sem uma presença relevante, longe do seu desempenho no papel de Tony Blair em The Queen.

A grande maioria do elenco secundário está também muito bem representado por nomes como Sam Rockwell, Matthew Macfadyen, Kevin Bacon, Oliver Platt e Rebecca Hall. Tendo esta última tido um papel pouco relevante na trama e que mereceria ter sido mais aprofundada.



Em Frost/Nixon assistimos a um grande confronto de actores, com especial destaque para o brilhante desempenho de Frank Langella e para a edição do filme. Este é um excelente trabalho de realização que merece o estatuto de grande obra cinematográfica, peca simplesmente por nos parecer que o maior ponto de impacto se resume à célebre expressão "I'm saying that when the President does it, that means it's not illegal!"

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